“SENTI QUE ELE MORREU NA PISTA”: BRABHAM CITA “CHOQUE” COM MORTE DE RATZENBERGER

A morte de Ayrton Senna foi o ato final de um fim de semana “nunca visto antes” — estas últimas, palavras de David Brabham, então companheiro de equipe do outro piloto que também perdeu a vida naquela trágica etapa de San Marino, em 1994: Roland Ratzenberger.

Brabham, filho do tricampeão mundial Jack Brabham, teve uma relação relativamente próxima com o austríaco, que fazia sua estreia na Fórmula 1 naquele ano. Era também o retorno de Brabham ao grid da F1, e ambos ficaram um tempo treinando juntos em Mônaco na preparação para a temporada.

Ratzenberger “parecia ser um ótimo cara, muito comprometido com corridas”, disse o ex-piloto à revista Warm Up na ocasião dos 20 anos da morte de Senna. “Foi uma pena ver alguém que acabou de chegar na F1 ser tirado dela. Trágico”, sentenciou.

“Estávamos em estado de choque, muitas emoções e coisas com as quais não estamos acostumados. Nunca tinha perdido um companheiro de equipe: as coisas não ficam claras na sua mente, você não sabe o que fazer e no que pensar. Foi um daqueles fins de semana que não se consegue esquecer por ter sido tão ruim. Minha esposa teve de me contar o que tinha acontecido: meu cérebro não absorveu”, contou David.

A morte de Ratzenberger aconteceu durante a classificação do GP de San Marino, em um trecho diferente ao da batida de Senna, a curva Gilles Villeneuve. Brabham ainda estava na pista quando o acidente fatal do austríaco aconteceu. “Eu me lembro de passar pelo carro e olhar para ver se Roland estava bem e, do que eu podia ver, a minha reação imediata foi: ‘Você morreu…’. Mas eu não sabia e a mente prega peças. Voltei para os boxes e a notícia veio. Foi um choque, apesar de eu ter meio que sentido que ele tinha morrido quando o vi na pista.”

“Havia uma nuvem pesada pairando sobre o time. Na noite de sábado, me perguntaram se eu queria correr ou não. Era uma escolha minha, e na hora eu não fazia ideia. Eu não sabia o que deveríamos fazer. Então eu disse: ‘Vamos fazer o warm-up e ver como eu me sinto’. Por qualquer razão, fomos bem rápidos com a Simtek. Acho que a equipe deixou o tanque vazio ou algo assim, mas fomos rápidos. Conforme voltei para os boxes, parecia que aquela nuvem tinha se dissipado um pouco. Todos estavam extremamente tristes — eles também nunca tinham passado por uma situação trágica assim, ter perdido alguém dessa forma. Era, ainda é, bem raro alguém morrer em um carro de corrida, mas eu decidi correr aquele dia pelo time para ajudar a todos se superarem”, contou.

Brabham vinha em 20º na corrida quando também passou pelo local da batida de Senna, na Tamburello. Mas ao contrário da sensação imediata ao ver o companheiro de equipe, afirmou que não havia se dado conta do quão sério havia sido o acidente.

“Tudo que vi foi que havia outro carro; pensei que fosse uma Tyrrell, não achava que era a Williams. Pode ser porque quando eu estava passando, tinham carros ao meu redor e eu não consegui ver direito, mas, de novo, eu não estava realmente olhando. Eu apenas sabia que tinha um carro na lateral da pista, mas não que era Ayrton até todos termos parado na reta de chegada. Aí alguém disse que era Senna”, acrescentou.

Brabham não teve a chance de um contato maior com Ayrton, mas a impressão que tinha do brasileiro era a mesma compartilhada por tantos outros. Naquela manhã de domingo, porém, o comportamento de Senna estava longe do familiar até mesmo para quem o via apenas de longe.

“Ele sentou na minha frente no briefing dos pilotos naquela manhã antes dele morrer, e foi meio esquisito e estranho. Normalmente, Ayrton sempre falava bastante sobre alguma coisa, sempre tinha algo a dizer. Mas naquele briefing, tudo que eu lembro é que muitos pilotos passavam por ele e o tocavam — o que era muito raro, normalmente isso não acontecia. Não sei se foi porque Ayrton estava muito triste com o acidente do Roland. Eu ouvi muitas histórias de que, de alguma forma, ele pensou que algo ruim fosse acontecer naquele fim de semana, que poderia seria com ele, e foi Roland, e também ouvi todo tipo de história — o quão verdadeiras elas são, não faço ideia. Ele estava muito abalado, muito distante naquele dia. No meu entendimento, não era o Ayrton que as pessoas normalmente teriam visto naquele fim de semana”, seguiu.

“Nós nunca vimos um fim de semana como aquele”, frisou, lembrando-se também do fortíssimo acidente de Rubens Barrichello ainda na sexta-feira. “Eu nunca tinha visto aquilo na F1 e, provavelmente, a maioria das pessoas também. Obviamente, na era do meu pai, a morte era uma coisa muito mais comum, mas, para nós, no início dos anos 90, ainda era muito raro ter alguém morrendo em um carro de corrida.”

Brabham não levou o carro da Simtek até o fim do GP de San Marino — abandonou na volta 27, com problemas na direção —, mas garantiu não ter arrependimentos pela decisão de correr. Era, na verdade, uma corrida “pela equipe”, conforme salientou.

“Acho que qualquer experiência como a daquele fim de semana contribui para você ser a pessoa que é hoje. Sempre acreditei que tem coisas boas que resultam de coisas ruins, e muitas coisas boas aconteceram depois daqueles acidentes em termos de segurança dos carros, para os pilotos, nas pistas. São as consequências da infelicidade de termos perdido dois pilotos: um incrivelmente especial para a F1 e outro que estava apenas começando a carreira. Se olharmos adiante, os pilotos das gerações seguintes estão em um ambiente mais seguro por causa daquilo”, concluiu Brabham.

Nos 30 anos da morte de Ayrton Senna, o GRANDE PRÊMIO resgata depoimentos dados à revista Warm Up de diversas personalidades da F1 que fizeram parte da vida do brasileiro.

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